30 julho 2008

teve uma outra vez em que saí do trabalho e fui direto ao dentista
como num dia por mês sempre o caso
e no consultório
enquanto devorava os almanaques infantis bairro-do-limoeiro
confesso
como um louco tergiversa
dentro de mim queimava quieta a parte louca da minha alma
faminta
(autofágica)
os aparelhos de tortura maquiados do moderno ultra-fantástico kit do pequeno ortodontista feliz avançavam irresolutos e impiedosos
a enjaular arcada dentária criminosa transgressora hedionda
masmorra, castigos
e ah as ironias..
do dentista à boca era só um engasgo.
cinco minutos.

passei em frente ao beco vizinho do boteco e do templo conforme o de sempre
lento, atento
há uma dança calada por entre calculadas cada uma das sinuosas sombras mudas
porém nada
ninguém
esquisito o movimento àquela noite nascente
indícios de sujeira no ar
mas
quando você quer você quer
quando precisa
a coisa é outra
coisa
muda
foda-se
estaciono bem na frente da viela
atravessado
foda-se
entre eu e o beco apertado agora apenas um maluco bizarro numa bicicleta
que ao me ver, me dirige a palavra em intransponível pedido transcendental elemento surreal da noite insana:
- pega lá pra mim cinco aí faz favor na humildade uma nóis passa o pano junto aí
entrar de terno
e gravata
auxiliar a correria de um nóia com medo
advérbios, advérbios
no fundo do corredor
dentre claustrofóbico um cenário de maquete empobrecida terceiro-mundista
me esperam maliciosas as mesmas crianças surdas e velhas de pó
ansiedade é uma fila de boca
cada passo, um quilômetro
me chamam dou a grana eu quero os meus e os do nóia na magrela
– são nove
deus!
eu penso
e logo me culpo
além de tudo herege..,
parecem infinitos sobre a palma da minha mão
‘talvez dure hora e meia’
penso
e não mais que de repente uma garota surge e grita
- as onça!
simples como hollywood
a cena congela
as pernas congelam
os tiras
os tiras os tiras os tiras os tiras
o mais sensato deitar e fingir um ataque do coração
talvez
porém soou menos artista
(e portanto mais seguro)
seguir por cima dos tapumes
e barracos
lamaçais
sangue nas guias
caçando em tropeços os passos de um elemento a balbuciar hieróglifos
aparentemente um nativo
calejado
adentro quintais de gente armada e sem camisa assistindo a porra da novela


saí de lá do outro lado da comunidade
voando manco à todo o vapor de minhas asas dopamínicas
nunca mais vi o mano da bicicleta
esperei a rota vazar fui pro carro peguei um cd sorri culpado
sujo
corruptível
um suspiro torto
prazeres culpas karmas
me estuprei mais um pouco

e essa é a mentira do dia.

Um comentário:

Anônimo disse...

CARALHO!

será que não li isso antes?


genial, pequeno.